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NITERÓI VIROU O TÚMULO DAS AÇÕES ESTRATÉGICAS?

OS BAIRROS DE RIO DO OURO E VÁRZEA DAS MOÇAS CARECEM DE AVENIDA OU RODOVIA PRÓPRIAS. TUDO O QUE SE FAZ DE INTERVENÇÃO URBANA É RECAPEAR ASFALTOS. ENQUANTO ISSO, A RODOVIA RJ-106, ESTADUAL, ACUMULA FUNÇÃO DE "AVENIDA DE BAIRRO", PREJUDICANDO O TRÁFEGO DESTINADO À REGIÃO DOS LAGOS.

Em Niterói, para cada ação acertada, umas cinco são erros constrangedores ou omissões vergonhosas. Se o edifício Gold Star sofre uma reforma total e se renova como prédio comercial repaginado, o Niterói Shopping degrada com a mesma fachada e a mesma estrutura de 38 anos atrás. Se temos a acertada criação da Avenida Cafubá-Charitas, dando fim ao suplício do pessoal da Região Oceânica trafegar para o Saco de São Francisco, os bairros de Rio do Ouro e Várzea das Moças sofrem por não ter acesso próprio, dependendo da RJ-106, rodovia estadual, para se comunicarem.

Neste caso, destaquemos que a RJ-106, ao acumular a função de "avenida de bairro", prejudica o tráfego de quem vai e vem de localidades da Região dos Lagos, sejam as relativamente mais próximas, como Saquarema e Araruama, sejam as mais distantes, como Iguaba Grande e Cabo Frio, e ainda tem a cidade da região da Costa do Sol, Macaé, no entorno da rodovia.

Niterói sofre uma fase terrível de cidade que parece que gostou de ser provinciana e fazer o papel de capacho da famosa cidade vizinha, o Rio de Janeiro. Antes considerado o Eldorado de todo interiorano fluminense, Niterói virou a própria cidade do interior, com as pessoas parecendo viver um autismo coletivo, sem perceber os reais problemas que escapam de sua rotina solipsista, voltada apenas às suas percepções meramente pessoais da vida.

Tem-se um pouco de absurdo em Niterói, onde, segundo o anedotário popular, urubu voa de costas. Temos, por exemplo, em Piratininga, uma "avenida de ciclovia" que não é avenida nem é para bicicletas, mas uma rua carroçável sem asfalto, cujo nome homenageia um famoso charlatão religioso, pretenso filantropo e "médium espírita" do Triângulo Mineiro, que num livro de 1966 acusou levianamente e sem embasamento os frequentadores do Gran Circo Norte-Americano, destruído por incêndio criminoso a uma semana do Natal de 1961, de terem "pagado o que deviam em (suposta) antiga encarnação".

Como é que se mantém uma homenagem a um religioso que, mesmo idolatrado em todo o Brasil (sem mérito, por ele ter sido um charlatão, produtor de literatura fake e um reacionário que usava a "caridade" como meio de promoção pessoal), ofendeu os frequentadores do referido circo, em tragédia que comoveu o país, e que em maioria eram niteroienses humildes que só tinham dinheiro para ver um espetáculo circense e não podem ser culpados por hipotéticos crimes ocorridos há quase dois mil anos?

Mas tem mais absurdos. Os parquiletes (parklets), currais que servem de assentos ou refeitórios para frequentadores de bares, são um terrível modismo mais inúteis do que o antigo Trampolim da Praia de Icaraí (1937-1964), "brinquedo" para mergulhadores mais afoitos. Instalados nos meios-fios das ruas, os parquiletes, além de darem um aspecto forçadamente "americano" nos bares, com aquela estética "Route 66", atrapalham o estacionamento de veículos, dificultam o tráfego e vão na contramão das necessidades de melhoria da mobilidade urbana.

Recentemente, tivemos o erro grosseiro de se abandonar o antigo prédio do Rio Decor, onde, no passado, abrigou a lendária loja Maveroy, na Avenida Feliciano Sodré, e o local virou ambiente de cracolândia, com sujeira e morte, e o lugar foi demolido, depois da decadência no período da pandemia da Covid-19.

Reduzido a um terreno vazio, o antigo Rio Decor, dizem, dará lugar a um condomínio convencional dotado apenas de espaço fitness, pequenas lojas de roupas, farmácia e botequins. Niterói ainda não vive a nova onda imobiliária de São Paulo, com seus edifícios arrojados dotados dos malls, ou seja, shopping centers que, mesmo integrados aos empreendimentos, são muitas vezes voltados a qualquer cidadão que esteja na área do respectivo condomínio.

Aqui fica ainda mais uma questão: de que adianta trocar a cracolândia do prédio abandonado do antigo Rio Decor por botequins barulhentos com alto risco de haver confusões, como brigas de torcedores que podem gerar violência e até mortes? Imagine a tragédia que seria diante de um ponto de ônibus com passageiros esperando transporte para áreas como Fonseca e cidades como Maricá, Itaboraí e, principalmente, São Gonçalo?

Para somar a coleção de gafes estratégicas de Niterói, temos a burrice do Grupo Mauá / Rio Ita de extinguir a icônica e tradicional Transturismo Rio Minho, a pretexto de "diminuir" o patrimônio da fusão dos dois grupos empresariais. Se fosse para extinguir empresas, as municipais niteroienses (como Expresso Tanguá e Auto Ônibus Alcântara) poderiam ser extintas, eliminando mais CNPJ e, assim, economizando custos de registros.

Com o fim da Rio Minho, se repetirá o que se repetiu com a Fagundes, que "inchou" demais assimilando a Viação Santa Izabel e, durante muito tempo, circulou com frota sucateada. Hoje as frotas do Grupo Mauá / Rio Ita são até bem conservadas e renovadas, mas até quando isso ocorrerá não se tem certeza. 

Com o inchamento da Expresso Rio de Janeiro, que já opera com "cabrito" (ônibus com motor dianteiro), a tendência é de piorar o transporte entre Niterói e a Baixada Fluminense. Como se não bastasse haver, também, o erro estratégico do Terminal João Goulart abrigar linhas rodoviárias, causando desconforto no embarque e desembarque de passageiros e complicando o trânsito de ônibus, ao passo que a Rodoviária de Niterói, também na Avenida Feliciano Sodré, fica vazia boa parte do tempo.

Pelo jeito, os pés dos niteroienses devem estar sangrando adoidado atingidos por tantos tiros. Enquanto os urubus voam de costas, os niteroienses, bitolados, não conseguem perceber os problemas à sua frente e, não obstante, cometem as piores decisões achando que fazem a coisa certa, até que seus netos possam alertar sobre os prejuízos causados. Niterói virou o túmulo das ações estratégicas.

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